terça-feira, 11 de maio de 2010

O BC e as manchetes inevitáveis

Amanhã será divulgada a ata do Copom referente à sua última reunião, quando os juros foram elevados em 75 bps. Eu gosto muito de reuniões do Copom: gosto de discutir qual será o resultado, se o BC acertou ou errou, se o ciclo está no começo ou no fim e o que foi escrito na ata. Mas, na minha opinião, uma das coisas mais marcantes dessas reuniões é que, não importa o que aconteça, nem em que situação encontre-se a economia nacional, alguns grupos reagem SEMPRE da mesma forma. É uma daquelas coisas da vida com as quais sempre podemos contar: o Chico Lang sempre acha que o Corinthians vai meter 8x0, a Portuguesa sempre perde o jogo mais importante do campeonato, o Joel "Prancheta" Santana sempre é técnico de um dos quatro times do Rio, o PMDB sempre é governista e, lógico, algumas pessoas sempre acham que a Selic tinha que ser menor. O interessante disso tudo é que o Chico Lang às vezes não sabe quem é o adversário do Corinthians, a Portuguesa não se importa se está jogando contra o Real Madrid ou o Guaratinguetá, o Joel Prancheta não precisa ir bem ou mal para ter um emprego garantido no mês seguinte, o PMDB não se importa se o governo é do PP ou do PSOL e, lógico, alguns grupos não se importam se a inflação está alta ou baixa ou se a economia está bem ou mal. Eles querem Selic mais baixa, ponto. Como quem analisa a economia com o fígado.

Aí, no "pós decisão" as manchetes são sempre iguais: "Grupo industrial critica política monetária", "Sindicatos dizem que juros servem ao mercado financeiro", "Acadêmicos afirmam que Copom não é competente". E essas manchetes independem do que aconteceu na reunião, no Brasil ou no mundo. Essas manchetes são as mesmas com alta ou queda da Selic, com recessão ou superaquecimento da economia, com crise ou bom momento no mundo. Sabe aquela maldita reportagem com descendentes dos países que o Brasil enfrenta na Copa? Algo como, Brasil x Ilhas Faroe e o jornalista encontra três caras que vieram do outro país e faz as mesmas perguntas de sempre: "como fica o coração divido?", "e a provocação no dia seguinte?". As manchetes pós Copom são a mesma coisa, só que MUITO mais frequentes. Ninguém se surpreende, ninguém se importa, não agrega mais nada e, por algum motivo, sempre estão lá.

Eu não tenho nada contra as pessoas defenderem seus interesses. Cada um segue os incentivos dados. É assim que as coisas funcionam e é assim mesmo que devem funcionar. Mas, pelo amor de Deus, não dá pra analisar o momento econômico um pouco só?

A última reunião, por exemplo. O Brasil cresceu, no primeiro trimestre, algo como 10% em termos anualizados. A demanda doméstica está explodindo, com expansão do crédito. O governo, como sempre, gasta muito mal, investe muito pouco e adora reajustes do funcionalismo. A inflação está acima do centro da meta, as expectativas de inflação estão em alta há diversos meses, a inflação de serviços está em torno de 7% nos últimos doze meses. Isso sem contar que a Selic, antes da alta de 75 bps em abril, estava na mínima histórica. Na mínima histórica!

Quer dizer, o cenário não é exatamente de economia fraca, confere?

Mas isso não importa. Os grupos que sempre reagem do mesmo jeito não se importam. E aí começam as pérolas: "O BC tem medo de ver o Brasil crescer", "Os juros altos são feitos para beneficiarem os bancos", "Abaixo à Selic" (essa última é uma das minhas favoritas). Os argumentos "econômicos" comumente são da linha "os diretores do Banco Central servem a interesses escusos, ao mercado financeiro". Então, quer dizer que sempre, em todos os anos, muitos dos diretores do Banco Central são pessoas ruins?! Pessoas que torcem contra o Brasil e estão lá para atrapalharem o país e ajudarem os bancos?

Eu tenho um grande amigo que também é economista. Ele é extremamente inteligente e muito gente fina, por sinal. Mas é um desses economistas maconh...um desses economistas "desenvolvimentistas" (seja lá o que isso quer dizer), que sempre acha que os juros estão altos. Da última vez que discutimos, eu precisei gastar duas horas argumentando que não sou, por princípio, a favor de juros altos. É lógico que não. Mas insisti que o controle da inflação é uma condição necessária para que o país possa crescer no longo prazo. Para que o horizonte de investimento seja mais previsível, incentivando a atividade econômica no futuro. Argumentei que o controle da inflação é especialmente benéfico para a população que consegue manter seu poder de compra. Até apelei para expressões que esses economistas maconh..."desenvolvimentistas" gostam: "o crescimento econômico nacional precisa de estabilidade dos preços", "o trabalhdor que luta por seu ganha pão é mais rico no final do mês com a inflação controlada", "precisamos de estabilidade dos preços para sermos uma nação forte, desenvolvida".

Ainda falei que, obviamente, eu gostaria de juros mais baixos - conheço os modelos econômicos e sei que os juros afetam negativamente os investimentos. Mas a culpa não é do Banco Central. Quem gasta muito é o governo, quem não investe em infraestrutura mas gasta com folha salarial é o governo. O Brasil tem um passado de hiperinflação. Temos índices semanais de inflação, como herança disso. Mas isso não é culpa do BC. O BC tem que manter a inflação na meta determinada. É assim que as coisas funcionam.

Se o BC pudesse mexer em outras coisas, que não os juros, a ata seria algo como. "O Banco Central iniciará esforços para investir em portos, aeroportos e estradas, como forma de diminuir os gargalos da economia nacional". "O Banco Central vai promover uma reforma da previdência que vise controlar os gastos com essa parcela da população, colocando o Brasil em linha com outros países de renda similar". "O Brasil vai promover reformas microeconômicas que aumentem a produtividade da economia nacional e eliminem ineficiências".

Já que estamos nessa, vamos agradar a todos os grupos: "O BC promoverá uma festa em comemoração à indústria nacional. A festa contará com a participação de Claudia Leite e Dudu Nobre. Cerveja e espetinhos Mimi gratuitos!".

No entanto, o BC tem como instrumento a taxa de juros. E tem como meta, manter a inflação dentro da meta. (Ainda estou falando com o meu amigo que é economista maconh...desenvolvimentista)

No final, confesso que desisti. Esse papo de que a mudança começa uma pessoa por vez é mentira. Demora muito para convencer uma pessoa por vez. Principalmente se essas pessoas forem economistas maconh...desenvolvimentistas. Acabamos falando sobre futebol. Ele acha que o Bayern tem um elenco muito bom e pode levar a final da Champions. Eu falei que acho que ninguém tira essa da Inter e que, se eu tivesse que escolher um jogador para começar a montar o meu time hoje, escolheria o Lúcio. Até eu sei que essa frase é forçada e que eu dificilmente tomaria essa decisão, na prática. Mas o cara é um monstro.

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